Você pretende que uma pessoa se ligue definitivamente a um só objeto de paixão,
como se fosse o único existente? Depois disso renunciar ao mundo – ficar cego para todas as
outras formosuras? Bela coisa, sem dúvida, uma pessoa em plena juventude enterrar-se para
sempre na cova de uma sedução, morto para todas as belezas do mundo em forma de mulher.
Tudo em nome de uma honra artificial que chamam fidelidade? Ser fiel é ridículo, tolo, só serve aos
medíocres. Todas as belas têm direito a um instante de nosso encantamento. E a fortuna de ter
sido a primeira não pode impedir às outras o direito de estremecer o nosso coração.
- Don Juan de Molière; trad. e adapt. de Millôr Fernandes, p. 5.
![]() |
Assumo que só comecei a ver esse filme por causa do carisma do Jude Law. |
Pensei em diversos filmes para fazer meu primeiro post de crítica cinematográfica, Inception, O Grande Truque, O Ritual, O Lobisomem, Operação Valquíria, Agentes do Destino, Crash, Hotel Rwanda, Capitão América, etc...ok que comentei sobre o Chris Nolan, mas não sobre um filme completo. Seja como for, o fato é que me sinto inspirada para escrever sobre o filme que acabei de assistir na televisão, especificamente na Tela de Sucessos: Alfie, o sedutor.
A película de 2004 é uma refilmagem e adaptação do romance homônimo do escritor Bill Naughton - houve um filme em 1966, com o grande Michael Caine no papel de Alfie. Não vou comentar sobre o nome do protagonista - que achei mais engraçado que charmoso -, ou sobre o título traduzido, meio donjuanesco, mas ainda assim, brega (o título original é apenas "Alfie", mas se 'Franklyn' virou por aqui 'O Justiceiro Mascarado' e 'Arsène Lupin' virou 'Arsène Lupin, o Ladrão mais charmoso do mundo', eu não devia me surpreender...).
Alfie é, à primeira vista, uma pessoa superficial que curte sapatos de marca, curte parecer mais que ser e aproveitar o que a vida tem de "melhor". Passa a segunda metade do filme, após um susto de possível câncer, dizendo que "vai mudar", e até o fim do filme não vi isso... O que acaba sendo um ponto para a história, visto que, na vida real, mudar É difícil, e nós, humanos, temos mais a capacidade de planejar isso que de praticar.
O filme retrata a vida do personagem principal (dãããã!), mais precisamente seus relacionamentos fluídos com as mulheres. Alfie é o bon vivant, nunca se entrega, não expõe seus sentimentos e usa uma capa de proteção contra eles. Não se doa, mas também não mente. É uma pessoa com bom jogo de cintura, que quando se vê naquela situação íntima de D.R. dá um jeito de ludibriar a fêmea e tomar chá de sumiço para evitar complicações. Ele consegue a vida que quer, com algum dinheiro, sem depender de ninguém e sem que ninguém dele dependa. Confesso que muitas vezes anseio isso (e vejo muitos contemporâneos meus fazerem o mesmo). Mas então Alfie questiona que não possui um coisa chamada paz de espírito diante da vida que levou. E pergunta-se o que, de fato, importa. Reconhece que todas as mulheres que já passaram por sua vida muito fizeram por ele sem que esse as tivesse retribuído. E... fim de filme. Com direito a uma caminhada pela noite... não sei se gostei da moral, aliás, nem sei se existe alguma moral ali.
Na verdade acho que não, e esse finalzinho com uma breve reflexão foi colocado pra que sinalizassem que ali era O FIM. Mas não critico isso, afinal, o que vale é vivenciar a experiência, nesse caso, de estar na vida de uma pessoa sem laços.
Acabei a película esperando um desfecho mais idealizado. Costume de experimentar aquela catarse quase sempre encontrada na ficção, nesse
Talvez o problema tenha sido pela história se passar em tempos que as pessoas realmente me parecem tratar-se como descartáveis e substituíveis; indiferentes. Não que no mito donjuanesco não haja isso, mas o protagonista tem como motivações a conquista e o fogo da paixão, enquanto Alfie se move como um pêndulo, indo e vindo sem parecer saber porquê o faz, imerso em vazio de propósito, exceto o quase sufocamento que a intimidade lhe trás e lhe motiva a fugir e novamente mover-se.
Isso me explica porque o sabor do Don Juan do século XIX me pareceu mais sutil, amargo e dramático que os dos livros de Tirso, Molière ou Zorilla. Que coisa....
Referências das obras Donjuanescas:
MOLIÈRE, Jean-Baptiste Poquelin de. Don Juan: o convidado de pedra. Porto Alegre: L&PM, 1997. Tradução e adaptação de texto teatral por Millôr Fernandes.
MOLINA, Tirso de, El Burlador de Sevilla. Madrid: Cátedra, 1997.ZORILLA, José. Don Juan Tenorio. Madrid: Cátedra. 2008.
** Link para download da peça Don Juan, de
Ps.: Um salve pra minha chefinha que me ajudou a saber mais sobre o querido Don Juan.
27 de Agosto de 2011 ~ 03:09h
Miss Bennet.
Nenhum comentário:
Postar um comentário